Atenção - Zika vírus pode desencadear síndrome paralisante rara
Por Cristian Edgar Aguazo
O zika vírus é o responsável pelo recente aumento do número de casos de microcefalia em bebês. Isso, por si só, já é uma tragédia extremamente preocupante e exige um esforço do poder público e de todos nós para tentar conter a proliferação do Aedes aegypti, que é o mosquito transmissor deste vírus.Mas não é só isso. Estamos observando também, paralelamente, um aumento do número de casos de uma síndrome neurológica que paralisa os membros inferiores, podendo atingir segmentos superiores do corpo, levando, inclusive, a situações de gravidade como a paralisia da respiração. É conhecida como Síndrome de Guillain Barré.Esta síndrome não é nova. Mas sua associação com o zika vírus, sim.Já há algum tempo sabe-se que agentes infecciosos como vírus ou bactérias exigem um trabalho extra das células de defesa. Quando somos infectados por um agente agressor, nosso “exército” imediatamente se mobiliza para nos defender. Em algumas pessoas, porém, pode-se desencadear uma reação paralela, onde a produção de anticorpos deflagra um mecanismo que nos faz produzir anticorpos contra nós mesmos. Exatamente assim. Isso é o que chamamos de reação “autoimune”. Na situação específica da Síndrome de Guillain Barré, os anticorpos produzidos causam a paralisia dos movimentos dos músculos da perna, impedindo as pessoas de andar. Se o quadro piorar, a paralisia pode atingir o sistema respiratório, fazendo com que a pessoa acometida necessite de respiração por meio de aparelhos, em uma UTI. Importante saber que esta síndrome paralisante é reversível na maioria dos casos. Pode acometer quaisquer pessoas, de quaisquer idades.O número de casos da Síndrome de Guillain Barré aumentou significativamente em 2015, especialmente nos estados mais acometidos pelo zika vírus e já se estabeleceu uma relação entre os mesmos.Até julho deste ano, 64 casos da Síndrome de Guillain-Barré (SGB) foram registrados na Bahia. Em Pernambuco foram 130 casos de Guillain-Barré em 2015. No ano passado, tinham sido só 9.No Ceará, foram confirmados dez casos até o mês de abril.No Maranhão, há 14 casos confirmados, com três mortes. Segundo nota da Secretaria da Saúde, entre esses 14 casos, oito confirmaram ter tido alguma virose antes.Sergipe registrou 28 casos este ano, número expressivo já que nos anos anteriores não há registro de nenhum caso. O Maranhão teve 32 casos suspeitos; no ano passado, foram 10.“É uma síndrome adquirida e já existe há praticamente 100 anos. Ela é caracterizada, sobretudo, por uma fraqueza nas pernas e alterações de sensibilidade progressivas. O mais comum é acontecer após uma infecção e, agora, ela está relacionada ao zika vírus, que foi identificado com um dos vírus disparadores da síndrome”, esclarece o infectologista Rodrigo Leal Silva.“Neste momento, temos que encarar que existe um indício forte de relação entre o zika e a síndrome de Guillain-Barré, mas para ter certeza absoluta precisamos de mais elementos e avaliar com mais profundidade os pacientes que desenvolveram a síndrome”, diz o médico Marcondes Cavalcante França Junior, coordenador do Departamento Científico de Neurogenética da Academia Brasileira de Neurologia (ABNeuro). A síndromeA síndrome de Guillain-Barré é uma doença rara - atinge em média uma pessoa a cada 100 mil habitantes – e que pode surgir após infecções por vários tipos de vírus ou bactérias. De origem autoimune, ela ocorre por causa a produção inapropriada de anticorpos que passam a atacar a bainha de mielina, que é uma substância que recobre e protege os nervos periféricos.Como alguns vírus e bactérias podem possuir proteínas semelhantes às presentes na bainha de mielina, em alguns casos eles podem levar o sistema imunológico a criar anticorpos contra essas proteínas, passando a atacar não só o vírus invasor, mas também a bainha de mielina.O ataque dos anticorpos cria um intenso processo inflamatório que leva à destruição da bainha de mielina, que bloqueia a passagem dos estímulos nos nervos motores, ocasionando, assim, paralisia muscular com pouca ou nenhuma diminuição da sensibilidade.Em alguns casos, a manifestação da SGB ocorre após a ocorrência de cirurgias, vacinas, traumas, linfomas, HIV, entre outros. SintomasA fraqueza muscular é o principal sintoma da síndrome de Guillain-Barré. A fraqueza, que pode apresentar diferentes graus de agressividade, geralmente acomete as pernas e se espalha para outros grupos musculares, em direção aos braços, tronco e face. Nos casos mais graves, pode ocorrer a paralisia total dos membros, além de comprometimento dos músculos respiratórios e da face.Além da fraqueza ou paralisia muscular, sintomas como taquicardia, queda ou amento da pressão arterial, retenção urinária ou constipação intestinal e dor nos membros acometidos também são relatados nos quadros de SGB. Diagnóstico e tratamentoO diagnóstico da síndrome de Guillain-Barré é feito, primariamente, de forma clínica, a partir da observação e análise dos sintomas, com a complementação de exames laboratoriais que comprovem a impressão médica e exclua outras causas possíveis para a fraqueza ou paralisia muscular.Ainda não há cura específica para a doença. O tratamento é focado no combate aos sintomas e minimização dos danos motores, com injeção de imunoglobinas (anticorpos contra os auto-anticorpos que estão atacando a bainha de mielina) e plasmaférese (uma espécie de hemodiálise na qual é possível filtrar os auto-anticorpos que estão atacando a bainha de mielina).Em geral, há uma progressão dos sintomas da doença nas duas primeiras semanas, quando ocorre a estabilização do quadro nas duas semanas seguintes. A partir daí, começa um processo de regressão da SGB, que pode durar várias semanas ou meses até a recuperação total.Graças à capacidade de regeneração da bainha de mielina dos nervos periféricos, a grande maioria dos pacientes consegue recuperar todos os movimentos após um ano da doença.Entretanto, cerca de 30% das pessoas com síndrome de Guillain-Barré apresentam fraqueza residual após três anos e aproximadamente 3% podem sofrer uma recaída da fraqueza muscular e formigamento muitos anos depois do ataque inicial, de acordo com estudos do National Institute of Neurological Disorders and Stroke – Ninds (Instituto Nacional de Desordens Neurológicas e Derrame, em livre tradução do inglês), dos Estados Unidos.A mortalidade da síndrome de Guillain-Barré é considerada baixa, aproximadamente 5%. E entre 5 a 10% dos pacientes permanecem com sintomas motores ou sensitivos incapacitantes que lhes impedirá de voltar a andar sem ajuda.Entre os critérios que estão associados a um maior risco de sequelas estão a idade acima de 50 anos, o rápido avanço da fraqueza e paralisia (em menos de uma semana), a necessidade de ventilação mecânica e o quadro de diarreia prévio ao surgimento dos sintomas da síndrome.De acordo com o Ministério da Saúde, a rede pública (SUS) oferece gratuitamente 35 procedimentos para tratamento de Guillain-Barré, entre procedimentos diagnósticos, clínicos, cirúrgicos, de reabilitação e medicamentos.